10º DOMINGO COMUM
10º Domingo do Tempo Comum - Ano B
Neste 10º Domingo do Tempo Comum, a Palavra de Deus leva-nos
a meditar sobre a nossa resposta de vida ao projeto de Deus para
nós, na liberdade de optar pelo bem e pelo mal.
O Evangelho centra o nosso olhar na pessoa de Jesus, que os seus
conterrâneos, entre eles tantos familiares, não aceitaram como
enviado de Deus e não perceberam, até se opuseram, à vontade de
Deus revelada em Jesus. Na caminhada da fé, cada um é livre de
optar: ou ficar pelos dispersos sentidos de vida, ou permanecer na
única família de Jesus, de «quem quiser fazer a vontade de Deus».
A segunda leitura realça que, para o cristão, viver só faz sentido
na
certeza da ressurreição, na caminhada de vida interior que se
renova dia a dia em perspectiva da eternidade.
Neste horizonte neo-testamentário, meditemos em particular a
primeira leitura que nos mostra, recorrendo à história mítica de
Adão e Eva, o que acontece quando rejeitamos as propostas de
Deus e preferimos caminhos de egoísmo, de orgulho e de
autossuficiência…
Viver à margem de Deus leva, inevitavelmente, a trilhar caminhos
de sofrimento, de destruição, de infelicidade e de morte.
MENSAGEM
A nossa leitura começa com a “investigação” de Deus… Antes de
proferir a sua acusação, Deus – o acusador e juiz – investiga,
descobre e estabelece os fatos.
Primeira pergunta feita por Deus ao homem: “onde estás?” A
resposta do homem é já uma confissão da sua culpabilidade: “ouvi
o rumor dos vossos passos no jardim e, como estava nu, tive medo
e escondi-me” (vers. 9-10). A vergonha e o medo são sinal de uma
perturbação interior, de uma ruptura com a anterior situação de
inocência, de harmonia, de serenidade e de paz. Como é que o
homem chegou a esta situação? Evidentemente, desobedecendo a
Deus e percorrendo caminhos contrários àqueles que Deus lhe
havia proposto. A resposta do homem trai, portanto, o seu
segredo
e a sua culpa.
Depois desta constatação, a segunda pergunta feita por Deus ao
homem é meramente retórica: “terias tu comido dessa árvore, da
qual te proibira de comer?” (vers. 11). A árvore em causa – a
“árvore do conhecimento do bem e do mal” – significa o orgulho,
a
auto-suficiência, o prescindir de Deus e das suas propostas, o
querer decidir por si só o que é bem e o que é mal, o pôr-se a
si
próprio em lugar de Deus, o reivindicar autonomia total em
relação
ao criador. A situação do homem, perturbado e em ruptura, é já
uma resposta clara à pergunta de Deus… É evidente que o homem
“comeu da árvore proibida” – isto é, escolheu um caminho de
orgulho e de auto-suficiência em relação a Deus. Daí a vergonha
e
o medo.
Ao defender-se, o homem acusa a mulher e, ao mesmo tempo,
acusa veladamente o próprio Deus pela situação em que está (“a
mulher que me deste por companheira deu-me do fruto da árvore e
eu comi” – vers. 12). Adão representa essa humanidade que,
mergulhada no egoísmo e na auto-suficiência, esqueceu os dons de
Deus e vê em Deus um adversário; por outro lado, a resposta de
Adão mostra, igualmente, uma humanidade que quebrou a sua
unidade e se instalou na cobardia, na falta de solidariedade, no
ódio. Escolher caminhos contrários aos de Deus não pode senão
conduzir a uma vida de ruptura com Deus e com os outros irmãos.
Vem, depois, a “defesa” da mulher: “a serpente enganou-me e eu
comi” (vers. 13). Entre os povos cananeus, a serpente estava
ligada
aos rituais de fertilidade e de fecundidade. Os israelitas
deixavamse
fascinar por esses cultos e, com freqüência, abandonavam
Jahwéh para seguir os rituais religiosos dos cananeus e
assegurar,
assim, a fecundidade dos campos e dos rebanhos. Na época em
que o autor jahwista escreve, a serpente era, pois, o “fruto
proibido”,
que seduzia os crentes e os levava a abandonar a Lei de Deus. A
“serpente” é, neste contexto, um símbolo literário de tudo
aquilo que
afastava os israelitas de Jahwéh. A resposta da “mulher”
confirma
tudo aquilo que até agora estava sugerido: é verdade, a
humanidade que Deus criou prescindiu de Deus, ignorou as suas
propostas e enveredou por outros caminhos. Achou, no seu
egoísmo e auto-suficiência, que podia encontrar a verdadeira
vida à
margem de Deus, prescindindo das propostas de Deus.
Diante disto, não são precisas mais perguntas. Está claramente
definida a culpa de uma humanidade que pensou poder ser feliz em
caminhos de egoísmo e de auto-suficiência, totalmente à margem
dos caminhos que foram propostos por Deus.
Que tem Deus a acrescentar? Pouco mais, a não ser condenar
como falsos e enganosos esses cultos e essas tentações que
seduziam os israelitas e os colocavam fora da dinâmica da
Aliança
e dos mandamentos (vers. 14-15). O nosso catequista jahwista
sabe que a serpente é um animal miserável, que passa toda a sua
existência mordendo o pó da terra. O autor vai servir-se deste
dado
para pintar, plasticamente, a condenação radical de tudo aquilo
que
leva os homens a afastar-se dos caminhos de Deus e a enveredar
por caminhos de egoísmo e de auto-suficiência.
O que é que significa a inimizade e a luta entre a “descendência”
da
mulher e a “descendência” da serpente? Provavelmente, o autor
jahwista está, apenas, a dar uma explicação etiológica (uma
“etiologia” é uma tentativa de explicar o porquê de uma
determinada
realidade que o autor conhece no seu tempo, a partir de um
pretenso acontecimento primordial, que seria o responsável pela
situação atual) para o fato de a serpente inspirar horror aos
humanos e de toda a gente lhe procurar “esmagar a cabeça”; mas a
interpretação judaica e cristã viu nestas palavras uma profecia
messiânica: Deus anuncia que um “filho da mulher” (o Messias)
acabará com as conseqüências do pecado e inserirá a humanidade
numa dinâmica de graça.
Atenção: o autor sagrado não está a falar de um pecado cometido
nos primórdios da humanidade pelo primeiro homem e pela primeira
mulher; mas está a falar do pecado cometido por todos os homens
e mulheres de todos os tempos… Ele está apenas a ensinar que a
raiz de todos os males está no facto de o homem prescindir de
Deus e construir o mundo a partir de critérios de egoísmo e de
autosuficiência.
Não conhecemos bem este quadro?
ATUALIZAÇÃO
• Um dos mistérios que mais questiona os nossos contemporâneos é
o mistério do mal… Esse mal que vemos, todos os dias, tornar sombria e
deprimente essa “casa” que é o mundo, vem de Deus, ou vem do homem? A Palavra
de Deus responde: o mal nunca vem de
Deus… Deus criou-nos para a vida e para a felicidade e deu-nos
todas as condições para imprimirmos à nossa existência uma dinâmica de vida, de
felicidade, de realização plena.
• O mal resulta das nossas escolhas erradas, do nosso orgulho,
do nosso egoísmo e auto-suficiência. Quando o homem escolhe viver
orgulhosamente só, ignorando as propostas de Deus e prescindindo do amor,
constrói cidades de egoísmo, de injustiça, de prepotência, de sofrimento, de
pecado… Quais os caminhos que eu escolho? As propostas de Deus fazem sentido e
são, para mim, indicações seguras para a felicidade, ou prefiro ser eu próprio
a fazer as minhas escolhas, à margem das propostas de Deus?
• O nosso texto deixa também claro que prescindir de Deus e
caminhar longe d’Ele, leva o homem ao confronto e à hostilidade com os outros
homens e mulheres. Nasce, então, a injustiça, a exploração, a violência. Os
outros homens e mulheres deixam de ser irmãos, para passarem a ser ameaças ao
próprio bem-estar, à própria segurança, aos próprios interesses. Como é que eu
me situo face aos meus irmãos? Como é que eu me relaciono com aqueles que são
diferentes, que invadem o meu espaço e interesses, que me questionam e
interpelam?
• O nosso texto ensina, ainda, que prescindir de Deus e dos seus
caminhos significa construir uma história de inimizade com o resto da criação.
A natureza deixa de ser, então, a casa comum que Deus ofereceu a todos os
homens como espaço de vida e de felicidade, para se tornar algo que eu uso e
exploro em meu proveito próprio, sem considerar a sua dignidade, beleza e
grandeza. O que é que a criação de Deus significa para mim: algo que eu posso
explorar de forma egoísta, ou algo que Deus ofereceu a todos os homens e
mulheres e que eu devo respeitar e guardar com amor?
Fonte:
© Sacerdotes do Coração de
Jesus - Dehonianos
Fraternidade Nossa Senhora da Apresentação.Irineu Maciel de Medeiros
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